Alguns anos atrás, quando um dos meus jogadores criou um mateiro (ou ranger, em inglês) para minha primeira campanha de AD&D, uma de suas reclamações era que, devido ao parco número de proficiências (NWP's) iniciais de seu personagem, ele não conseguira comprar todas as perícias que queria, pois achava que um "mateiro decente precisava de mais perícias".
Na época achei que ele tinha certa razão, e provavelmente devo ter dado algumas perícias bônus ao seu personagem. Hoje não faria isso, por uma razão muito simples: as NWP do AD&D não são perícias. Ou melhor dizendo, funcionam de modo bastante distinto de perícias de outros sistemas, como GURPS, d20 ou Shadowrun.
Nesses sistemas, as perícias definem aquilo que o personagem sabe/pode ou não sabe/não pode fazer em uma aventura. Na maioria dos casos, se uma perícia não está na planilha do personagem, ele simplesmente não pode tentar fazer determinada ação (ainda que alguns sistemas permitam utilizar determinadas perícias de modo improvisado, mas com penalidades substanciais).
Muitos mestres, experientes em outros sistemas de jogo baseados em perícias, aplicavam o mesmo conceito às NWP's e não permitiam que os personagens fizessem algo que não estava explicitado em sua planilha, e alguns jogadores acabavam frustrados, como meu amigo do exemplo acima, querendo mais "perícias" para seus personagens.
Aliás, já citei em uma mensagem anterior um caso ocorrido numa sessão de AD&D na qual o personagem, um bardo, para fugir de um combate no qual estava em desvantagem, pulou da janela do segundo andar de uma taverna com a intenção de cair montado em seu cavalo, que estava parado em frente ao estabelecimento. Uma ação desesperada, com certeza, mas que enriqueceria a sessão. Mas o DM achou o contrário e penalizou o jogador, fazendo seu personagem se estatelar no chão simplesmente por não possuir a NWP Acrobacia.
De qualquer modo, a principal diferença entre o sistema de proficiências e o de perícias é que as proficiências simplesmente oferecem um sistema ou ferramenta de resolução para casos complicados que, na pré-história do RPG, eram decididos no improviso pelo DM. Antigamente, se o personagem do exemplo acima quisesse pular pela janela para cair em seu cavalo, o Mestre tinha de improvisar na hora algum tipo de resolução - um teste de atributo, um teste de d%, etc. A vantagem do sistema de NWP é que simplesmente se dispõe a oferecer uma ferramente unificada para tais casos.
Ao contrário de perícias, o personagem não precisa fazer testes em ocasiões trivais, e o fato de ele ter uma determinada NWP em sua planilha signifca somente que ele é um "especialista" na área. O Player's Handbook da 2a Edição é bastante claro nesse ponto:
"Quando um personagem utiliza uma proficiência ou o sucesso é automático ou ele deve fazer um teste. Se for uma tarefa simples ou se a proficiência tiver utilidade limitada no jogo (como carpintaria ou sapataria), não é necessário fazer quaisquer testes em circunstâncias normais. Porém, se a tarefa for difícil ou estiver sujeita a falhas, o jogador deve fazer o teste".
Voltando ao exemplo do bardo acima, eu exigiria, sim, um teste de proficiência. Caso o personagem não tivesse Acrobacia, eu exigira um teste de destreza, ainda que com um redutor considerável. Mas não penalizaria o personagem por tentar uma ação cinematográfica ou ousada.
Da mesma forma, no AD&D, um personagem sem Natação ainda pode tentar boiar num rio, mas com certeza não conseguiria salvar um companheiro que estivesse se afogando; um personagem sem Cavalgar pode andar a cavalo, mas certamente não conseguirá controlar um cavalo assustado, muito menos lutar enquanto estiver montado.
Os exemplos acima mostram que, na verdade, o sistema de NWP's nada mais é que uma simples ferramenta para resolução de situações que também serve para adicionar mais detalhes a um personagem. Ao contrário de um sistema de perícias, os personagens não se tornam reféns daquilo que está (ou não) em suas planilhas.
Em meus anos como mestre de AD&D sempre utilizei esse sistema e, apesar de sua simplicidade, acho uma excelente adição a qualquer jogo.
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