quinta-feira, 26 de março de 2009

Aventuras Fantásticas


Já dizia Aldacir Louro, lá pelos idos de 1955, que recordar é viver. Então, aqui vai o momento “fundo do Baú” do Masmorras & Dragões.

Antes do lançamento oficialmente do GURPS, o primeiro sistema de RPG a ser traduzido e comercializado no país em 1991, a imensa maioria daqueles que viriam a se tornar os futuros “rpgistas” (incluindo este que vos escreve) havia tido algum contato com os livros-jogos da série “Aventuras Fantásticas”.

Lançados no Brasil a partir de 1989 pela editora Marques & Saraiva, a coleção Aventuras Fantásticas era a adaptação da série britânica Fighting Fantasy, publicada no Reino Unido pela editora Games Workshop dos designers e autores Ian Livingtsone e Steve Jackson (que, ao contrário do que muitos pensam, não é o mesmo Steve Jackson que criou o GURPS).

A maioria dos livros da série, que na Inglaterra chegou a ter 62 títulos publicados entre 1982 e 1995 (no Brasil foram 29 títulos na série principal), trazia aventuras de fantasia medieval, ambientadas no mundo de Titã, como O Feiticeiro da Montanha de Fogo, A Floresta da Destruição, A Cidade dos Ladrões e As Cavernas da Feiticeira da Neve; no entanto, alguns títulos traziam aventuras de ficção-científica (A Nave Espacial Traveller, As Coligações de Kether, entre outros).

Vale mencionar que desde 2002 a editora inglesa Wizard Books vem relançando os livros da série lá fora. Aqui no Brasil, infelizmente, nenhuma editora se habilitou a fazê-lo, e hoje os livros de Aventuras Fantásticas só podem ser encontrados, com muita sorte, em alguns sebos.

Para jogar nestes livros, assim como em um RPG, o leitor criava um personagem, anotava suas estatísticas e equipamento em uma planilha e ia seguindo as instruções apresentadas nos diversos capítulos, de modo semelhante à série “Escolha sua Aventura”, publicada pela Ediouro nos anos 80. Porém, o que diferenciava os livros de Aventuras Fantásticas era a utilização de uma mecânica de jogo que fazia uso de dados de 6 faces para resolver algumas situações, principalmente combates.

Para a moçada brasileira que tinha pouco ou nenhum contato com RPGs e afins, exceto por jogos ocasionais no Phantom System (o “genérico” da Nintendo lançado aqui pela Gradiente na época) ou Mega Drive, essa série marcou época. Aliás, lembro até hoje do dia em que comprei meu primeiro exemplar da série, na Livraria Siciliano, em Santos (SP). Acredito que foi na época de férias escolares, pois eu simplesmente não consegui deixar o livro de lado até derrotar o temível Balthus Dire e terminar a aventura.

E vocês, leitores, também começaram com as saudosas Aventuras Fantásticas?

Até a próxima!

quinta-feira, 19 de março de 2009

Drows

Em uma postagem recente de seu blog, minha amiga Ana descreveu algumas das experiências de suas personagens com os primos malignos dos elfos, os drows, também conhecidos como “elfos sombrios”. Inspirado no texto da Ana, resolvi abordar os vilões de pele obsidiana, mas por outra ótica – pois, ao contrário da maioria dos jogadores, senhoras e senhores, eu odeio os drows.

Pronto, falei!

Eu realmente não consigo dizer uma razão específica para desgostar deles, mas posso dizer que essa antipatia vem desde a primeira vez que li a descrição desses manés no Monstrous Manual.
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Seja qual for o motivo, o conceito dos drows simplesmente não funciona para mim. No vejo nessa raça motivação ou credibilidade suficiente para utilizá-los em minhas campanhas. A idéia original, de uma tribo de elfos que perdeu uma guerra, foi exilada para o subterrâneo e agora quer vingança contra o mundo da superfície parece algo datado, implausível ou saído de uma história ruim de ficção-científica da década de 50.
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O fato dos drows terem sido utilizados como vilões principais até a exaustão em muitos cenários oficiais pode ter contribuído para isso. E para piorar as coisas, na época que comecei a jogar RPG, lá pelos anos 90, a maioria dos jogadores que conheci queria fazer um “drow renegado” – conceito que, na maioria das vezes só levava à criação de clones mal-feitos de Drizzt. E acreditem, era difícil aturar esses personagens, quando todo drow renegado tinha aquela atitude emo, típica da década: “meu povo me odeia pois sou bom, o povo da superfície me odeia porque sou drow... ó vida, ó azar...” Argh!
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Originalmente o termo “drow” (e sua variante, “trow”) era utilizado no folclore escocês, mais especificamente no folclore das Ilhas Órcadas, para se referir a um tipo de fada maligna, muito semelhante aos svartalfar escandinavos.

Porém, os drows, como conhecemos no AD&D, foram criados pelo “pai da criança”, Gary Gygax. Sua estréia se deu na série de aventuras Against de Giants, publicadas em 1981. Desde então, as ignóbeis criaturas vem sendo utilizadas como vilões principalmente em Forgotten Realms, Greyhawk e em diversas aventuras. Infelizmente.

Porém, nem tudo está perdido. Dois cenários me apresentaram novos conceitos de elfos sombrios que, em minha opinião, funcionam muito bem.

Um deles vem do GURPS Fantasy. Neste cenários, elfos sombrios são apenas tribos ou grupos de elfos racistas e xenófobos que crêem que os elfos, devido à sua superioridade natural, deveriam governar o mundo e se livrar de todas as outras raças. Renegados pelos outros elfos, que consideram tal visão um sacrilégio, eles vivem isolados no interior de florestas antigas e impenetráveis, donde tramam sua vingança contra a humanidade. Este conceito pode não ser um primor de originalidade, mas é mais plausível.

O segundo vem de Dragonlance. Lá não existem drows; elfo sombrio é simplesmente um título dado a qualquer elfo que foi exilado devido à prática de algum crime que os elfos consideram hediondo, como assassinato de outro elfo ou, como no caso do mago Dalamar, prática de magia negra.

Uma outra alternativa, e que venho desenvolvendo há um tempo, é substituir os drows por seres feéricos sombrios, como foi feito no excelente suplemento The Shadow Rift, de Ravenloft - embora, nesse caso, muito provavelmente o DM terá de adaptar os diversos seres lá descritos à sua campanha particular, o que não é tão difícil.

Até a próxima.
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sexta-feira, 13 de março de 2009

Masmorras





Masmorras são um dos elementos mais tradicionais do RPG de fantasia, seja em campanhas épicas ou – principalmente – espada & feitiçaria. Particularmente acho que explorar uma masmorra bem elaborada e com um design inteligente e criativo é algo muito divertido.

Porém, eu não sou apaixonado por masmorras. Como todo elemento de fantasia, masmorras podem cansar se forem utilizadas de modo banal, o que leva à campanha a se tornar “a masmorra da semana”. Talvez seja por isso que eu nunca me empolguei com o conceito de mega-masmorras, isto é, masmorras gigantescas compostas de vários andares ou níveis, nas quais você pode conduzir uma campanha inteira (as ruínas de Myth Drannor, em Forgotten Realms, são um exemplo de mega-masmorra da 2ª Edição).

Mas, como disse acima, a exploração ocasional de uma masmorra pode ser o foco de uma sessão bastante divertida e emocionante. Abaixo estão três elementos que acho que são essenciais para criar masmorras plausíveis e divertidas.

Porém, antes de prosseguirmos, um esclarecimento: o termo “masmorra” não serve para descrever somente masmorras no sentido estrito do termo. Em jogos de fantasia, qualquer estrutura natural ou não, que esteja abaixo do solo (na maior parte dos casos – há exceções) pode ser considerada uma masmorra. Por exemplo, catacumbas subterrâneas, o complexo de esgotos de uma grande cidade, uma série de cavernas naturais, uma cidade antiga e abandonada construída por anões ou svirfneblin, as ruínas de uma abadia abandonada em uma ilha perdida ou a torre de um feiticeiro.

Motivo / história

Toda “masmorra” precisa de um motivo ou razão para existir. O histórico do local não precisa ser extremamente detalhado ou elaborado, mas deve conter informações suficientes sobre o propósito do lugar e porquê ele foi construído. Por exemplo, se o local for uma cidade subterrânea abandonada, o Mestre precisa saber quem a construiu, quem viveu nela e porque ela não é mais habitada (talvez ela tenha sido construída por Anões que a abandonaram após um ataque de orcs ou após acordarem um dragão). Se o local for um conjunto de catacumbas subterrâneas, quem construiu o lugar? Quem está enterrado lá? Talvez ela tenha sido construída para abrigar os restos mortais de sacerdotes ou de um rei.

Com o propósito e o histórico da masmorra definidos de antemão, fica muito mais fácil projetá-la.

Ecologia

Se a masmorra for habitada, é preciso definir quem serão estes habitantes. Se há mais de uma espécie vivendo no local, qual é o relacionamento entre eles? São inimigos ou aliados?

Com mortos-vivos, por exemplo, não é preciso se preocupar muito com o quesito ecologia, afinal, eles não se alimentam (exceto, ocasionalmente, de alguns aventureiros tolos...), não defecam e não se reproduzem. Mas com outras espécies, como kobolds, por exemplo, é preciso levar em consideração como eles conseguem alimento e qual é sua relação com os vizinhos (se houver) e com o mundo exterior. E, atenção: cuidado com a superpopulação! É muito fácil se empolgar e enfiar monstros ou adversários em todos os cantos de uma masmorra – o que acaba levando a um chatíssimo jogo de “matar e pilhar”.

Lembre-se: as criaturas devem estar lá por um motivo, e não apenas para serem mortas ou despejadas pelos personagens.

Desenho

É aqui que consideramos o design da “masmorra” em si. Depois que o mestre definir qual é o propósito e o histórico do local, e quais as criaturas que nela habitam, ele deve pôr a mão na massa e projetar o local, que deve seguir uma certa lógica. Cidades subterrâneas devem seguir um certo padrão urbanístico, com praças, residências, etc. Uma cripta subterrânea provavelmente terá uma capela e talvez, no caso de um herói ou rei, uma sala de troféus – e, claro, várias armadilhas para desencorajar ladrões de túmulos.

E falando em armadilhas: elas são muito divertidas, e a maioria dos jogadores espera encontrá-las em suas explorações. Porém procure ter em mente que: i) armadilhas que matam instantaneamente, sem dar ao PC uma chance de reagir são extremamente desagradáveis (muitos jogadores se sentem trapaceados, e com razão); ii) toda armadilha, por mais bem elaborada que seja, deve ter um modo de ser evitada ou desarmada pelos jogadores, mesmo que eles não sejam bem-sucedidos.

Uma boa pesquisa em livros de história antiga ou pela internet pode fornecer várias idéias, plantas e dicas de design de ambientes subterrâneos históricos e realistas, como as Catacumbas de Paris, da foto acima.

Mas não se esqueça que, acima de tudo, este é um jogo de fantasia; portanto, nunca deixe o realismo se interpor no caminho da diversão. Se você teve uma idéia que achou genial, mas acha que ela é “fantástica demais”, não se acanhe. Use-a. Lembre-se da “masmorra” da seqüência inicial de Caçadores da Arca Perdida ou da pirâmide de Reino da Caveira de Cristal, ou mesmo do templo do Escorpião-Rei em O Retorno da Múmia. Não são nada realistas... mas são muito divertidos.

Até a próxima!

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terça-feira, 10 de março de 2009

A união faz a força

Um dos problemas mais comuns de mestres e narradores de RPG, e que freqüentemente afunda inúmeras campanhas, é a falta de coerência entre os personagens dos jogadores. Para garantir um mínimo de verossimilhança e coerência em sua campanha, é necessário que os personagens compartilhem certos objetivos e motivações. Do contrário, o grupo corre o risco de se tornar um show de horrores, em que cada personagem pensa primeiro em si próprio e depois nos objetivos do grupo. Sem falar que é muito difícil que um grupo de personagens que não se conhecem e foram reunidos ao acaso apenas para uma missão fiquem juntos por muito tempo – por outro lado, esse tipo de situação funciona perfeitamente para aventuras independentes.

Esse artigo (originalmente publicado no finado site “A Arca”) oferece algumas sugestões que podem servir para manter a união entre personagens, apresentando motivos que poderiam levar os personagens a permanecerem juntos em uma campanha, além de também oferecer idéias para outro problema comum dos mestres: como iniciar a campanha. Embora a principal abordagem esteja direcionada a campanhas de fantasia, eventualmente serão discutidas situações e variações que podem ser aplicadas a outros gêneros de RPG.

Amigos de infância
Todos os personagens cresceram juntos na mesma vila ou cidade e, acima de tudo, compartilham uma forte amizade entre si. Mesmo personagens “malignos” dificilmente trairão seus amigos de infância, a menos que isso venha a lhes trazer grandes vantagens. Nesse cenário, o sacerdote do grupo é um acólito do templo local, o mago trabalha como aprendiz de outro, cuja torre localiza-se próxima à cidade, o guerreiro é filho do ferreiro local, o ladino é o “garoto problema” da cidade, etc.

Um belo dia, algo ocorre na cidade – um ataque de alguma criatura, um assassinato misterioso, um escolástico que pára na cidade procurando ajuda – que acaba levando o grupo de amigos a investigar o porquê do ocorrido, lançando-os na campanha.

A desvantagem desse tipo de cenário é que todos os personagens serão relativamente jovens e inexperientes (o que pode ser bom com jogadores iniciantes) e a maioria dos personagens será da mesma raça, embora seja possível contornar isso com um pouco de criatividade – por exemplo, o Anão do grupo, por algum motivo, vive entre humanos e trabalha na vila como ferreiro ou carpinteiro.

Caso o mestre e os jogadores queiram personagens mais experientes, pode-se aplicar uma variação do tema acima, em que cada um dos personagens seguiu seu caminho e deixou a cidade após a maioridade, porém, em nome de sua amizade, se comprometeram em encontrar-se todo ano na mesma data em sua cidade natal. Os que não pudessem comparecer, sempre tentariam avisar os amigos, até que um dia, um dos personagens (um NPC) não aparece e envia uma mensagem muito suspeita. Os outros decidem, então, investigar o que aconteceu com seu amigo desaparecido.

Parentesco
Nesse cenário, todos os personagens pertencem à mesma família ou clã. Alguns são parentes próximos (irmãos, primos), outros já são parentes mais distantes – filhos bastardos que não se conheciam, primos de 23o grau, etc.

Os personagens podem se envolver por uma série de motivos. Por exemplo, eles precisam limpar o nome de sua família ou clã, ou quebrar uma maldição que a aflige por diversas gerações, ou ainda, todos eles se reúnem no funeral do patriarca ou da matriarca da família e descobrem, durante a leitura da última carta ou testamento do falecido, que eles devem cumprir uma determinada missão – recuperar terras da família, se vingar de uma família rival, etc. Esse cenário pode ser uma ótima oportunidade de interação e interpretação entre jogadores, principalmente se envolver filhos ilegítimos ou rivalidade entre parentes.

Grupos de personagens com grau de parentesco entre si funcionam melhor em jogos históricos (celtas, viquingues, Japão feudal) ou cenários de fantasia que tenham forte influência histórica.

A desvantagem dessa abordagem é que não permite muita diversidade de raças, exceto no caso de mestiços, como meio-elfos, por exemplo. Certas raças como os Anões, no entanto, dada a sua estrutura social, funcionam perfeitamente para este tipo de cenário.

Patrono
Alguém contrata os personagens para uma determinada missão, provavelmente uma que só se cumprirá a longo prazo (achar todos os pedaços de um cetro mágico que foi separado há muitas eras, etc.), dando tempo para que os personagens criem vínculos de amizade e/ou respeito entre si até o final da campanha.

Ou o patrono poderia reuni-los para uma missão menor, mas ter ficado tão satisfeito com seu desempenho, que a partir daquele momento sempre utilizará o mesmo grupo para suas missões.

Em cenários de fantasia, magos poderosos ou nobres são os patronos mais comuns, mas uma igreja ou o soberano de um pequeno país ou cidade-estado também cumprem esse papel.

Nem todo patrono é benevolente. Alguns podem eliminar os personagens caso eles falhem – o que, por si só, já seria motivo para unir o grupo contra um mesmo inimigo (ver abaixo).

Variações: Outros patronos possíveis seriam executivos e CEO’s de uma grande corporação (campanhas de cyberpunk), um rico fazendeiro que contrata alguns homens para resgatar sua esposa e filhos que foram seqüestradas por uma quadrilha de bandidos (faroeste) ou um famoso ocultista que reúne um grupo de pessoas que tiveram experiências com o sobrenatural a fim de formar um grupo para combater os seres da noite (horror).

É importante lembrar também que patronos não se limitam a indivíduos, e diversas organizações e/ou entidades que empregam operativos independentes, como certas agências governamentais que fazem uso de agentes externos ou locais (agências de espionagem e inteligência, por exemplo), uma instituição religiosa ou mesmo o governo de um pequeno país podem servir como patrono, de acordo com o cenário.

Emprego
Essa situação é semelhante à descrita acima. Nesse caso, porém, os personagens são funcionários ou proprietários de alguma agência ou organização, e não meros agentes independentes contratados por um patrono. Eles podem não gostar um do outro, nem compartilhar um relacionamento pessoal, mas se respeitam e sabem que os dons e habilidades de seus companheiros são essenciais para o grupo.

Por exemplo, em um cenário de fantasia eles poderiam pertencer a uma companhia de aventureiros/mercenários ou uma guilda de ladrões, ou mesmo serem um pequeno grupo de aventureiros que decidiu deixar uma outra organização para montar o próprio negócio. Um grupo de piratas ou corsários também se encaixa nessa categoria.

Variações: Em cenários de cyberpunk, essa é uma situação bastante comum, onde os PC’s formam um grupo de mercenários que sempre trabalham juntos. Nesse caso é importante que os jogadores se reunam para definir como seus personagens se conheceram, o que um pensa dos outros, etc.

Cenários de ficção científica ainda oferecem outras oportunidades. Os personagens podem trabalhar para uma mesma organização (a Federação de Jornada nas Estrelas), ser caçadores de recompensa (como na série Firefly) ou piratas espaciais.

As forças armadas também estão inclusas nessa categoria, bem como uma instituição religiosa (por exemplo, uma ordem de monges guerreiros, como os Hospitalários ou Templários, que seguem votos de obediência ou um grupo de caçadores de vampiros que serve ao Vaticano).

Certas entidades também fazem excelentes patronos, como a ONU no cenário I.S.T., lançado para GURPS Supers há alguns anos, no qual praticamente todos os super-heróis do mundo trabalham para as Nações Unidas.

Causa ou inimigo em comum
O motivo da união dos personagens é que todos seguem uma mesma causa ou combatem um inimigo em comum.

Talvez esse inimigo tenha destruído e incendiado suas cidades (um grande dragão vermelho), invadido terras que sua religião considera sagrada (a motivação das Cruzadas, por exemplo), matado algum parente, transformado sua namorada em uma vampira ou quebrado sua coleção de bichinhos de cristal da Boêmia – não importa o motivo, o indivíduo (ou organização) em questão cometeu alguma atrocidade e precisa ser destruído.

Para dar um senso maior de urgência à campanha, o mestre pode determinar que se tal inimigo não for detido em um determinado tempo, ele poderá dominar ou destruir o mundo. Colocar os personagens em uma situação de guerra em que todos devem lutar para libertar seu reino ou país também funciona.

Esse cenário se adapta praticamente a qualquer gênero: horror (os personagens devem enfrentar as forças da noite ou, no caso do jogo Werewolf: the Apocalypse, combater uma ameaça sobrenatural que pode destruir o planeta), fantasia (deter um dragão; impedir uma invasão de orcs; frustrar os planos de uma divindade maligna, como Takhisis, Ares ou Loki), ficção científica (encontrar a cura para um vírus alienígena que foi espalhado na Terra e, em cinco anos, destruirá toda a vida no planeta; ou um grupo de rebeldes que luta contra um Império Intergaláctico Maligno). O céu é o limite!

Situação extraordinária
Aqui os personagens se encontram pela primeira vez e resolvem se unir para enfrentar uma mesma ameaça ou simplesmente sobreviver.

Talvez os personagens foram capturados por um grupo de escravistas ou piratas, e estão sendo levados para outro continente, com uma cultura exótica e totalmente diferente da sua – ou mesmo outro planeta, no caso de uma campanha de ficção científica. Eles podem ser capturados não para trabalharem como escravos, mas para lutar em jogos gladiatoriais, e nesse caso, já se conheceriam na arena. Ou ainda, eles são soldados e foram capturados pelo exército inimigo, e agora devem se unir para sobreviver e voltar para casa.

Um grupo de super-heróis poderia se unir para enfrentar uma determinada ameaça e após unir suas forças, decidem ficar juntos e formar um super grupo.

E em um cenário clássico de fantasia, os personagens poderiam ser reunidos para cumprir uma missão extraordinária, como jogar um certo anel mágico na cratera de um vulcão.
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quarta-feira, 4 de março de 2009

Paladinos

Com o advento da 3ª e 4ª edições de D&D, muitas das classes de personagens tradicionais sofreram uma forte descaracterização, e talvez a mais avacalhada delas seja o paladino. Na terceira edição, não só humanos, mas membros de qualquer raça podiam se tornar paladinos. Na quarta edição, as raízes lendárias e literárias desta classe de personagem foram totalmente desprezadas e jogadas no lixo (não sei se os designers da nova edição fizeram isso conscientemente ou não) e o paladino se tornou um mero guerreiro a serviço de qualquer divindade – nicho este que, na segunda edição, é preenchido pelo cruzado, uma classe de personagem opcional.

Mas para quem sabe de onde veio o conceito dos paladinos, tais absurdos são inaceitáveis.

Paladinos têm sua origem não somente nos cavaleiros das Lendas Arturianas, como Sir Galahad e Sir Lancelot, mas principalmente nas canções de gesta francesas que narram de maneira épica os feitos de reis franceses, como Carlos Magno, e principalmente dos valorosos e piedosos cavaleiros de sua corte, que eram chamados de paladinos ou Doze Pares. A Canção de Rolando é um dos mais famosos exemplos de canção de gesta medieval.

Inicialmente, esses poemas épicos tratavam de fatos históricos, porém de modo idealizado. Freqüentemente, os inimigos dos paladinos eram sarracenos, e muitas das histórias descrevem as Cruzadas ou as campanhas de Carlos Martel contra os invasores mouros. Com o passar do tempo, a partir dos séculos XII e XIII, os menestréis introduziram não somente elementos fantásticos, como princesas em perigo, magos, monstros, fadas e gigantes, mas também diversos companheiros de aventuras dos cavaleiros, como Turpin, arcebipo de Reims, e Maugrim, o Mago, primo de um dos paladinos.

Muitas das características dos paladinos de AD&D derivam das canções de gesta. Por exemplo, a montaria fiel foi inspirada em Bayard, o cavalo mágico de Renaud de Montauban, um dos Doze Pares; a espada sagrada é baseada nas armas de diversos paladinos, principalmente Durandal, a espada sagrada de Rolando.

O ciclo dos paladinos da França serviu, também, como principal inspiração ao livro Three Hearts and Three Lions, de Poul Anderson. O autor, por sua vez, adicionou outros elementos fantásticos aos paladinos retratados em seu romance – muitos dos quais também serviram como inspiração na criação dos paladinos de AD&D.

Alguns irão afirmar que essas mudanças recentes só trouxeram benefícios, como o fato de agora um paladino nunca perder seu status. Eu discordo. O paladino não é um mero cavaleiro ou um cruzado – sua origem é bem específica, e suas características próprias deveriam ter sido preservadas. Com tantas mudanças, os designers da nova edição, no mínimo, tinham de ter mudado o nome da classe ou se livrado dela completamente, como fizeram com os “bardos”.

É verdade que, do modo que é descrido na 2ª edição, o paladino é uma das classes mais difíceis de se interpretar, e talvez a que tenha o código de conduta mais restritivo. Tampouco essa classe de personagem se encaixa em todo estilo de campanha – paladinos não têm nada a ver com cenários inspirados em Espada & Feitiçaria ou em cenários de campanha “exóticos” como Kara-Tur ou Dark Sun, por exemplo.

Porém, nas mãos de um jogador que entenda a essência dessa classe de personagem, e com um Mestre que incentive os PC’s a terem conduta heróica e que saiba criar um clima de fantasia épica, o paladino se torna uma valiosa adição a qualquer grupo de fantasia medieval.
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segunda-feira, 2 de março de 2009

Metaenredo

Uma das maiores críticas feitas pelos grognards tradicionalistas ao AD&D pós-Gygax é a utilização de “metaenredo” nos cenários publicados pelas editoras.

Para quem não está familiarizado com o conceito, uma breve explicação: “metaenredo” é um neologismo, o termo que escolhi para traduzir a palavra inglesa metaplot, que significa um entrecho onipresente que ocorre nos bastidores de um cenário de campanha e que é desenvolvida e publicada em suplementos, romances e aventuras.

Essa tendência se disseminou nos anos 1990, quando alcançou níveis ridículos. Forgotten Realms é o maior exemplo disso – o excesso de metaenredo, iniciado com a infame Guerra dos Avatares, transformou o que era um cenário pitoresco e genial (vide a primeira edição de FR, publicada em 1987 e conhecida como “caixa cinza”) em um cenário ridículo, uma Disneylândia fantástica e uma grande paródia.

Porém, nem o pior de Forgotten Realms nesse quesito se compara ao World of Darkness original, publicado pela White Wolf Game Studios, e que é o perfeito exemplo dos exageros do metaenredo (alguém lembra do imbróglio envolvendo Samuel Height?).

Seus jogos, em especial Vampire, Werewolf e Mage estavam tão mergulhados no metaenredo que qualquer Mestre/narrador precisava de um conhecimento enciclopédico para poder conduzir os jogos a contento – na prática, a maioria dos Mestres, incluindo este que vos escreve, ignorava sumariamente o entrecho.

Na maioria dos casos, as críticas ao entrecho universal são válidas. A principal é que isso gera uma proliferação de NPC’s super-poderosos e onipresentes, que tira dos personagens dos jogadores (PC’s) a possibilidade de ter algum impacto real na campanha – em FR, por exemplo, freqüentemente os PC's acabam sendo jogados para escanteio e reduzidos a meras testemunhas das ações de Elminster e cia.
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Idem em Vampire: the Masquerade, onde os figurões importantes, influentes e poderosos são os NPC's descritos em suplementos oficiais, e não os PC's.

Entretanto, o conceito de metaenredo, em si, não é intrinsecamente ruim. Usado com moderação e inteligência, ele impede que o cenário fique estagnado e possibilita novas idéias e opções para campanhas que parecem ter chegado ao fim da linha. Na verdade, seria burrice deixar um cenário morrer simplesmente porque ninguém quer alterar ou atualizar o cenário original.

Usado com inteligência e parcimônia, o metaenredo pode reviver um cenário esquecido ou abandonado. Dois bons exemplos que posso citar são:

i) o suplemento From the Ashes, publicado em 1992 para atualizar o mundo de Greyhawk para a 2ª Edição e que, apesar de ter um tom mais sombrio do que as edições anteriores, revitalizou um cenário magnífico que era desconhecido de toda uma nova geração de jogadores por estar fora do prelo por muitos anos.




ii) a 4ª edição de Shadowrun, publicada em 2005, que não só substituiu o (hoje) ultrapassado conceito de “cyberdecks” por uma rede que opera em uma matriz de realidade virtual, como também atualizou outras tecnologias que ainda estavam “presas” às convenções do cyberpunk oitentista.

Em ambos os casos acima, o uso do metaenredo possibilitou que cenários clássicos que estavam estagnados fossem revigorados e recuperassem seu potencial de aventuras.

Resumindo, uma mudança “oficial” não é algo necessariamente ruim, desde que feita de modo razoável e inteligente, e que possa ser facilmente ignorada pelos jogadores que não gostarem das mudanças nem quiserem utilizá-las em suas campanhas.

Até a próxima.
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